LIvros

REDLARA: LIvros (Reprodução Assistida)

Doação de Óvulos

Não faz muito tempo, a infertilidade nas pacientes com insuficiência ovariana do tipo hipogonadismo hipergonadotrófico era insolúvel. Atualmente, a doação de oócitos constitui-se no método de reprodução assistida indicado para resolver essa problemática. A primeira gestação derivada de uma doação de oócitos ocorreu numa paciente com insuficiência ovariana precoce (IOP) que infelizmente resultou em aborto (Trounson e cols., 1983). Entretanto, alguns meses mais tarde, Lutjen e cols. (1984) relataram uma gravidez com nascimento de uma criança proveniente de oócito doado anonimamente. Posteriormente, vários autores referiram sucesso com o emprego dessa metodologia (Asch e cols., 1987; Feichtinger e Kemeter, 1985; Rosenwaks e cols., 1986). A doação de oócitos não é apenas indicada para o tratamento da menopausa precoce, disgenesias ovarianas ou após ooforectomias bilaterais, mas também nas situações de presença da função ovariana, porém com repetidas falhas após estimulação ovariana nos programas de fertilização "in vitro" (FIV). Nessa população, o emprego da doação de oócitos acarreta um aumento dos índices de parto por ciclo de 0.8% para 16% (Burton e cols., 1993). Além disso, estará também aconselhada nos casos de risco de doença genética, como na Coréia de Huntington, etc. Recentemente, houve uma ampliação das indicações da doação de óvulos nas pacientes com menopausa fisiológica, especialmente na faixa entre os 50 e 60 anos. Paulson e Sauer (1994) defendem esse procedimento nas pacientes que desejam engravidar, apesar de estarem em menopausa fisiológica, desde que se enquadrem como normais após rígidos exames médicos. Entre uma das mais freqüentes indicações da doação de oócitos está a IOP que é definida pelo desaparecimento dos ciclos menstruais antes da idade dos 40 anos (Jaffe, 1986). A IOP ocorre em aproximadamente 1% das mulheres (Oskarsson e cols., 1990). Em geral, essas pacientes apresentam os clássicos sintomas de amenorréia, gonadotrofinas elevadas e diminuição dos níveis plasmáticos de estrógenos. Coulam (1982) acredita que aproximadamente 20% das mulheres com IOP e cariótipo normal apresentam reação autoimune. Essas pacientes mostrariam elevados títulos de anticorpos antiovário, antitireóide e anti-suprarenal. Mignot e cols. (1989) estudaram a presença de anticorpos em pacientes com IOP e apesar de não identificarem um fator imunológico específico, verificaram que 92% das pacientes apresentaram autoanticorpos. Rebar e cols. (1982) relataram que a IOP não é permanente num limitado número de casos, como evidenciou pelo retorno espontâneo dos ciclos menstruais e até de gestações. Esse fato ocorreu nas pacientes que apresentaram níveis de estradiol acima do habitual para a menopausa e valores de LH superiores aos do FSH. Por outro lado, a perda da função ovariana em razão da ablação cirúrgica dos ovários, endometriose pélvica severa ou mesmo de uma infecção pélvica grave, pode desenvolver quadro clínico e laboratorial igual ao da IOP. A doação de oócitos constitui-se na situação clínica única em que a gestação é obtida na ausência de corpo lúteo e onde importantes informações podem ser colhidas sobre o fenômeno de sincronia entre o endométrio e embrião, ou melhor, do processo inicial de implantação embrionária. 
Escolha das doadoras
Habitualmente, nosso serviço obtém oócitos doados entre as pacientes participantes dos programas de FIV ou, raramente daquelas que realizam cirurgia para laqueadura tubária. No Brasil, o Conselho Federal de Medicina estipulou normas éticas para orientar a organização de programas de doação de oócitos. A doação nunca terá caráter lucrativo ou comercial, além disso os doadores não devem conhecer a identidade dos receptores e vice-versa. Obrigatoriamente, será mantido o sigilo sobre a identidade dos doadores de gametas e pré-embriões, assim como dos receptores. Em situações especiais, as informações sobre doadores, por motivação médica, podem ser fornecidas exclusivamente para médicos, resguardando-se a identidade civil do doador. Por outro lado, as clínicas, centros ou serviços que empregam a doação devem manter, de forma permanente, um registro de dados clínicos de caráter geral, com as características fenotípicas e uma amostra de material celular dos doadores. Na região de localização da unidade, o registro das gestações evitará que um doador tenha produzido mais que duas gestações de sexos diferentes, numa àrea de um milhão de habitantes. Além disso, a escolha dos doadores é de responsabilidade da unidade que dentro do possível deverá garantir que o doador tenha a maior semelhança fenotípica e imunológica e a máxima possibilidade de compatibilidade com a receptora. Na situação de um casal infértil doador, este deverá assinar um consentimento informado autorizando a doação de óvulos. Do ponto de vista médico, as doadoras devem apresentar uma idade de 35 anos, ausência de antecedentes de doenças genéticas na família e testes laboratoriais negativos para AIDS, sífilis e hepatite tipo B. Apesar da doadora de oócitos no momento do procedimento apresentar uma sorologia negativa para AIDS, teoricamente existe um risco de posterior soro conversão. Nessa linha de pensamento, destaca-se um estudo prospectivo multicêntrico (Moomjy e cols., 1995) realizado entre doadores de sangue com sorologia negativa no momento da transfusão, em que se observou que de 11532 pacientes que foram submetidos a cirurgias cardiovasculares e receberam 120213 transfusões, apenas dois indivíduos mostraram sorologia posterior para AIDS positiva (estimativa de risco : 1/60000), fato relacionado com a soroconversão dos doadores. Além disso, a chance de inoculação do vírus da AIDS através da transferência de um embrião seria sensivelmente menor do que a ocasionada por um frasco de sangue doado, sendo na pior das hipóteses de 1 caso por 60000 transferências embrionárias, isto por analogia com a transfusão de sangue. Entretanto, deve-se destacar que até hoje não há relatos da transmissão do vírus da AIDS durante o processo de doação de óvulos por doadoras com sorologia negativa. No futuro, a caracterização do antígeno pela técnica de PCR poderia reduzir o já teórico risco de transmissão de AIDS por doação de óvulos. Habitualmente, existem poucas pessoas com interesse em doar óvulos, por isso outras fontes de doação têm sido estudadas. Cha e cols. (1991) conseguiram uma gestação após a maturação de oócitos obtidos do ovário de paciente submetida `a cirurgia ginecológica. Recentemente, Trounson e cols (1994) relataram a maturação e fertilização de oócitos obtidos por aspiração folicular em ciclos não estimulados de pacientes com ovários micropolicísticos. Usando um sistema de aspiração modificado e meio de cultura com soro fetal, gonadotrofina menopausal humana (0.075 UI), gonadotrofina coriônica humana (0.5 UI) e estradiol (1mg/ml), obtiveram após 48 horas de cultura, maturação em 81% dos oócitos e fertilização normal em 34%. Um total de 13 pacientes foram tratadas com a obtenção de 1 gestação.
Sincronização doadora-receptora
Os primeiros esquemas de sincronização entre doadora-receptora empregavam os esteróides de forma cíclica e fixa, com um aumento periódico do estradiol na tentativa de imitar os incrementos habituais da fase folicular de um ciclo menstrual (Lutjen e cols., 1984). Dessa forma, após o sangramento menstrual, iniciava-se o valerianato de estradiol (VE) na dose diária de 1mg por dia, com aumentos progressivos até 6mg na metade do ciclo. A progesterona sempre era introduzida no 15º dia na forma de supositório vaginal (dia 15 : 25mg, dia 16 : 50 mg e do dia 17 em diante : 100mg) até o 26º dia do ciclo. Na metade da fase progestacional era freqüente a indicação da biópsia endometrial para definir um padrão histológico endometrial ideal, caso contrário, novos ajustes de medicação eram realizados. Em seguida, suspendia-se os esteróides, fato que acarretava o fluxo menstrual e tinha início um novo ciclo. A paciente permanecia com ciclos de reposição hormonal até que a doação de oócito fosse viável. Em geral, a sincronização entre doadora e receptora deveria ocorrer com a transferência de embriões entre o 15º e o 20º dia do ciclo artificial da receptora (ideal entre o 17º e o 20º dia). Caso contrário os embriões seriam congelados e transferidos num ciclo subsequente. Atualmente, os modelos de administração de esteróides tentam solucionar os problemas de sincronia entre doadora e receptora pelo prolongamento da fase folicular da receptora. Inicialmente, Serhal e Craft (1987) confirmaram que a receptividade endometrial para a implantação embrionária não seria dependente da dose de estradiol ou progesterona. O emprego de estradiol por duas a quatro semanas e a introdução da progesterona no dia anterior ao da coleta dos oócitos seria suficiente para a obtenção de bons resultados. Em microscopia comum é freqüente a identificação de transformações secretoras no endométrio após 3 a 7 dias de uso da progesterona. Nessa época, a microscopia eletrônica identifica transformações nas células endometriais típicas da receptividade endometrial (Murphy e cols., 1987). Atualmente, acredita-se que a avaliação imunohistoquímica do endométrio (identificação das proteínas PP14 e 24K) marcaria com maior precisão o potencial para implantação embrionária do que o habitual estudo histológico endometrial (Rizk e cols., 1992). Devroey e cols. (1989a) também sugerem que um programa eficiente de criocongelamento de embriões poderia solucionar os problemas de sincronização entre doadora e receptora. Os embriões provenientes dos oócitos da doadora seriam congelados e posteriormente descongelados em época apropriada do ciclo da receptora. O emprego de ciclos menstruais artificiais para a transferência de embriões derivados de oócitos doados permitiu o estudo da chamada "janela" endometrial de receptividade. Habitualmente, nos mamíferos essa janela estaria aberta por poucas horas (Wu e Chang, 1972), entretanto, nos primatas esse período eleva-se para até 3 dias (Hodgen, 1983). Do ponto de vista prático, as gestações em pacientes com função ovariana ausente resultariam da transferência de embriões para um endométrio já submetido à ação da progesterona por 1 a 4 dias, desde que previamente desenvolvido pelos estrógenos. Inicialmente, no Centro de Reprodução Humana da Fundação Maternidade Sinhá Junqueira utilizou-se de um modelo semiprogramado, denominado esquema de Viena (pílula + citrato clomifene + gonadotrofina menopausal humana + dexametasona) para a estimulação do ovário da doadora e o processo de sincronização doadora-receptora obedecia os seguintes passos (Figura 8.1) : 1. Quando a doadora inicia o uso de anticoncepcional oral, ou seja, no 1º dia da menstruação, a receptora começa o VE na dose de 2mg por dia. 2. A doadora termina o anticoncepcional oral sempre numa 2ª feira, nessa ocasião a receptora aumenta a dose de VE para 4 mg por dia 3. No 1º dia de estimulação ovariana da doadora, 5 dias após o término da pílula eleva-se a dose de VE na receptora para 6mg por dia. 4. O ponto seguinte de acoplamento é o momento em que a ultra-sonografia sinaliza para a administração de hCG na doadora, nessa ocasião inicia-se o uso de progesterona na receptora na dose de 50mg por dia, diminuindo-se o VE para 4 mg diários. 5. No dia da transferência embrionária eleva-se a dose de progesterona para 100mg/dia até a confirmação ou não da gravidez. A transferência embrionária é realizada no 4º dia de uso da progesterona (Tabela 8.1).
 
 
 
Tabela 8.1 - Pontos importantes no processo de sincronização entre doadora 
e receptora com qualquer esquema de estimulação ovariana 
Pontos Doadora Receptora
Dia da hCG 10.000 UI VE 4mg + P4 50mg
Período da transferência embrionária 48 horas 56 horas
Dia da transferência VE 4mg + P4 100mg
Gestação confirmada VE 8mg + P4 100mg
VE = valerianato de estradiol P4 = progesterona
No caso da receptora ainda possuir função ovariana são usados os análogos de GnRH para o bloqueio da atividade hormonal ovariana. Os principais pontos de acoplamento seriam os seguintes : 1. Quando a doadora inicia o uso de anticoncepcional oral, ou seja, no 1º dia da menstruação, a receptora começa o análogo (acetato de leuprolide na dose de 1 mg por dia). Após 15 dias, verifica-se a presença do bloqueio na receptora pela dosagem de estradiol plasmático ( 50 pg por ml) quando se inicia o VE na dose de 2 mg; 2. A doadora termina o anticoncepcional oral sempre numa 2º feira, nessa ocasião, a receptora aumenta o VE para 4 mg por dia; 3- No 1º dia de estimulação ovariana da doadora, eleva-se a dose de VE na receptora para 6mg por dia. A receptora pára de utilizar o análogo do GnRH no dia em que se administra a hCG para a doadora. Os passos finais são semelhantes aos descritos acima (Figura 8.2).
 
 
Atualmente, no Centro de Reprodução Humana da Fundação Maternidade Sinhá Junqueira usa-se preferencialmente um esquema de estimulação da ovulação para as doadoras composto de um bloqueio ovariano prévio com análogo de GnRH (acetato de leuprolide) seguido de FSH-HP altamente purificado. Nessa situação, a sincronização é simplesmente realizada com a manutenção de uma fase folicular mínima na receptora de 14 dias e máximo de 35 dias (doses de VE variáveis de 2mg a 6mg, adaptadas em função da avaliação ultra-sonográfica da espessura e do padrão endometrial) (Figura 8.3).
 
 
A manutenção da ação estrogênica por até 5 semanas não afeta os resultados de um programa de doação de oócitos (Yaron e cols., 1995). Remohi e cols. (1995) demonstraram que o conceito de fase folicular prolongada pode ser mantida até 15 semanas sem interferir nas taxas de gestação, implantação ou aborto. Entretanto, descrevem uma alta incidência (maior que 44%) de sangramento após 9 semanas de manutenção isolada da ação estrogênica. Habitualmente, essa conduta é fácil nas receptoras com ausência de função ovariana, entretanto, naquelas com função ovariana presente, pode-se usar análogos de GnRH para bloquear a função ovariana, seguindo-se a administração de VE segundo a orientação acima descrita. O uso prolongado de VE pode resultar escapes que nem sempre são fáceis de serem corrigidos com um aumento na dose de VE. A administração de progesterona inicia-se no dia da administração de hCG (50 mg/dia) ou no dia da coleta de oócitos pela doadora, porém na dose de 100mg por dia (Cano e cols., 1995). Comumente, a hCG é detectada 12 dias após a transferência embrionária, sendo que a suplementação com esteróides é mantida até que o tecido trofoblástico esteja apto para manter a gravidez. Acredita-se que a placenta possa assumir a produção de progesterona ao redor da 8ª semana de gestação (Csapo e cols., 1974). Dessa forma, nas pacientes com ausência de função ovariana, teoricamente a suplementação com esteróides deveria durar até 6 semanas após a transferência embrionária (Cameron e cols., 1989). Entretanto, existem divergências quanto ao tempo ideal para interromper o uso de estradiol e progesterona. Alguns autores preconizam a manutenção de doses fixas de esteróides por um tempo determinado, contudo, outros baseiam-se nas dosagens plasmáticas para o acerto final (Feichtinger e Kemeter, 1985). Em geral, o estradiol e a progesterona são interrompidos em média com 12 semanas. Nossa conduta é elevar o VE para 8mg por dia em caso de gravidez e manter a substituição hormonal até um mínimo de 12 semanas e máximo de 15 semanas. As doses de reposição hormonal baseiam-se nas taxas circulantes de esteróides avaliadas semanalmente ou quinzenalmente, procurando-se atingir os níveis de estradiol 2000 pg/ml e progesterona 50ng/ml (Formigli e cols., 1989).
Resultados com a doação de oócitos
Em geral, os resultados obtidos nos programas de doação de óvulos são na maioria das vezes superiores aos obtidos com FIV convencional. Isso pode ser observado nos relatos de Balmaceda e cols. (1992) que referem uma taxa de gravidez de 57.9% após transferência uterina ou de Formigli e cols. (1989) com uma taxa de 53.8% após a doação de oócitos pela transferência de gametas intratubária (GIFT). Moomjy e cols. (1995) relataram índices de gestação por transferência de 54% de um total de 240 ciclos do programa de doação de oócitos. Ao mesmo tempo, descreveram uma taxa de gestação múltipla de 46%, extremamente elevada diante da filosofia atual de controle da incidência de multiparidade. O programa de doação de oócitos do CRH da Fundação Maternidade Sinhá Junqueira acompanha os resultados gerais da literatura, porém com uma taxa de gestação múltipla aceitável (Tabela 8.2). Sauer e cols. (1995) analisaram a evolução de uma série de 36 pacientes receptoras com idade média de 52 anos (variando de 50 a 59 anos). Um total de 22 gestações (48.9%) foram obtidas, sendo que 17 tornaram-se viáveis (37.8%). A taxa de implantação embrionária foi de 20.6%, e a incidência de prenhez múltipla de 52.9%. Todas os partos ocorreram após 32 semanas (idade média para gestação única foi de 38.4 ± 1.9 semanas, para os gêmeos de 36.3 ± 1.4, para os triplos de 32 semanas). As complicações mais freqüentes foram a hipertensão gestacional (7 casos), o trabalho de parto prematuro (3 casos), e a diabete gestacional (1 caso). Borini e cols. (1995a) analisaram 34 pacientes com idade entre 50 e 62 anos que foram submetidas a um programa de doação de óvulos. Um total de 61 ciclos foram executados, obtendo-se uma taxa de gestação de 32.7% por transferência e de 52.9% por paciente. A taxa de implantação foi de 18%, com um índice de aborto de 5.5%. A idade média das gestações foi de 35 semanas, sendo que destas foram 16 únicas, uma gemelar e uma tripla. Na ocasião da publicação do trabalho já tinham ocorrido 12 partos e estavam em evolução 5 gestações. O peso médio dos recém-nascidos foi de 2.430g (variação de 900g a 3500g), não ocorrendo mortes fetais. Por outro lado, no grupo das doadoras com idade média de 30 anos (variação de 22 a 35 anos) ocorreram 51 induções de ovulação com taxa de gestação de 38.6%, de implantação de 16.5% e de aborto de 5.8%. Não se observaram diferenças significativas entre esses parâmetros, quando se compararam doadoras versus receptoras. Borini e cols. (1995b) relataram uma taxa de gestação superior nas pacientes acima de 40 anos que não apresentavam mais a função ovariana (30.8% por transferência) quando comparadas com as de 40 anos, porém com função ovariana presente (10.4% por transferência). Entretanto, quando as pacientes acima de 40 anos foram bloqueadas previamente por um período de 2 a 3 meses com análogos de GnRH antes da reposição hormonal, as taxas de gestação ficaram similares (30.6%) às obtidas nas pacientes sem função ovariana. Teoricamente, algumas disfunções endometriais causadas por uma produção inadequada de estrógenos e/ou progesterona ou mesmo por uma inatividade dos pinopódos poderiam ser corrigidas por um bloqueio prolongado prévio antes do início da reposição hormonal. Check e cols. (1995) verificaram também uma maior taxa de gestação (46.3% por transferência) nas pacientes com função ovariana ausente, em comparação com aquelas pacientes com função presente (20.4% por transferência). Uma justificativa para tal diferença poderia em parte ser explicada pela seleção das pacientes, desde que o grupo das pacientes com função ovariana seja mais heterogêneo e inclui pacientes com falhas prévias em FIV, infertilidade inexplicada ou fatores imunológicos associados. Berkowitz e cols. (1990) estudaram a evolução da gestação de 799 pacientes com idade acima de 35 anos, verificando que o prognóstico neonatal não foi diferente ao do grupo de pacientes abaixo de 35 anos. Entretanto, ocorreu um significativo aumento das complicações anteparto (doença hipertensiva específica da gravidez, diabete, placenta prévia e descolamento prematura de placenta). Apesar disto, não seria prudente estabelecer um limite etário para contra-indicar a gestação nas pacientes em menopausa fisiológica. Qualquer medida restritiva deveria se basear na análise de cada caso em particular após a identificação de problemas psicológicos ou de saúde (Moomjy e cols., 1995). O Registro da Sociedade Americana de Medicina Reprodutiva e da Sociedade de Tecnologia para Reprodução Assistida nos Estados Unidos (1995) informou que 35 centros executaram o programa de doação de óvulos no ano de 1993. Um total de 2766 ciclos foram executados com 2167 doações anônimas e 599 com doadores conhecidos, totalizando 2446 ciclos com transferência de embriões. Nos ciclos de doação anônima relataram 692 gestações e 554 partos, obtendo-se taxa de parto de 28.7% por transferência. A incidência de gestação múltipla foi de 40.7%. Nos ciclos com doadores conhecidos, referiram 227 gestações e 162 partos, totalizando uma taxa de parto de 31.6% por transferência. A incidência de gestação múltipla foi de 39.4%. Os programas de doação de oócitos nas pacientes com IOP empregando-se FIV com transferência de embriões para o útero ou trompa apresentaram taxas de gestações clínicas maiores que nas pacientes com função ovariana presente submetidas às mesmas técnicas para correção de sua infertilidade (Paulson e cols., 1990). Desse fato, especula-se que a estimulação do endométrio ou do epitélio tubário pela hiperestimulação ovariana poderia funcionar como um fator negativo nas chances de obtenção de uma gravidez. Por outro lado, discute-se o local ideal para a transferência do embrião obtido por doação de oócitos. Alguns autores referem que a transferência de embriões gerados "in vitro" para as trompas produziria altos índices de implantação quando comparada com a transferência diretamente para o útero (Devroey e cols., 1989b, Yovich e cols., 1987). Os principais argumentos estariam ligados às melhores condições de desenvolvimento embrionário no meio tubário, assim como na perfeita cronologia de entrada dos embriões na cavidade uterina. Entretanto, apesar dos argumentos teóricos terem base fisiológica, os dados que suportam a superioridade da transferência tubária são retrospectivos, não randomizados e sem análise de outras variáveis fundamentais como a idade das pacientes e a qualidade dos embriões. Balmaceda e cols (1992) confirmam altos índices de gravidez em programa de doação de oócitos e relatam num estudo prospectivo que nos ciclos de reposição hormonal com uniforme estimulação do endométrio, não há vantagem na transferência de embriões para a trompa em relação ao útero. Assim sendo, obtiveram 23 (54.7%) gestações num total de 42 pacientes. No grupo com transferência uterina, 12 (54.5%) pacientes engravidaram num total de 22, enquanto que no de transferência tubária foram obtidas 11 (57.9%) gestações entre 20 pacientes. Além disso, referem que a qualidade do embrião e a receptividade endometrial seriam variáveis de maior importância do que a forma de transferência do embrião para a cavidade uterina. O controle da reposição hormonal na receptora é um aspecto citado como fundamental. Alguns autores procuram valorizar o ajuste prévio das doses ideais de estradiol e progesterona, para posteriormente usa-las no ciclo de transferência embrionária, inclusive com uma obrigatória avaliação hormonal através de biópsias de endométrio. Franco Jr. e cols. (1993) dispensaram qualquer avaliação laboratorial ou histológica prévia, assim como durante o ciclo de transferência embrionária. Por outro lado, apenas a análise ultra-sonográfica da espessura ( 6mm) foi a base para o acerto das doses hormonais de reposição. Os resultados obtidos suportam essa conduta. Bustillo e cols. (1995) também observaram que nenhuma gestação foi obtida quando a espessura endometrial era < 5mm, assim como na situação em que o índice de pulsatilidade da artéria uterina era menor que 3.4. Por outro lado, desde que a janela de receptividade endometrial em humanos está entre 3 e 5 dias de exposição do endométrio para a progesterona (Meldrum e cols., 1989) é comum fixar-se o 4º dia como o momento da transferência embrionária para a receptora (Franco Jr. e cols., 1993). O modelo da doação de óvulos permite o estudo sobre o declínio da fertilidade da mulher com a idade. A questão fisiológica fundamental seria identificar os fatores causais : o óvulo, o útero ou ambos. Navot e cols. (1994) acreditam que a perda da fertilidade na mulher acima dos 40 anos está intimamente ligada a uma pobre qualidade dos oócitos. Da mesma forma, Sauer e cols. (1992) não encontraram diferenças entre as taxas de gestação obtidas após doação de oócitos em mulheres com 40 anos (34.5% de gestações por transferência) versus um grupo de mulheres controle com < 40 anos (32.6% de gestações por transferência). Cano e cols. (1995) acreditam que a idade aumenta a perda das gestações após o processo de implantação. Tal fato, ocorreria por um retardo na síntese de esteróides e que esse mecânismo está intimamente ligado ao envelhecimento uterino. Em conclusão, o programa de doação de oócitos é uma solução segura na correção da infertilidade na paciente com falência oocitária de qualquer natureza.
Tabela 8.2 - Resultados gerais do programa de doação de oócitos em 1995
Pacientes 39
Idade 5.7± 6.2
Número de ciclos 49
Número de oócitos doados 4.5 ± 2.0 
Taxa de fertilização 79.2
Número médio de embriões transferidos 3.3±1.57
Taxa de gestação clínica por ciclo 36.7 % 
Taxa de gestação clínica por paciente 46.15%
Taxa de implantação embrionária 13%
Taxa de aborto 11% 
Gestações em evolução 6 
Partos 10
Taxa de gestação múltipla 25 %
Referências Bibliográficas
Asch R., Balmaceda J., Ord T., Borrero C., Cefalu E., Gastaldi C., Rojas F. - Oocyte donation and gamete intrafallopian transfer as treatment for premature ovarian failure. Lancet., 1 : 687, 1987. Assisted reproductive technology in the United States and Canada : 1993 results generated from the American Society for Reproductive Medicine / Society for Assisted Reproductive Technology Registry. Fertil. Steril., 64 : 13-21, 1995. Balmaceda J.P., Alam V., Roszjtein D., Ord T., Snell K., Asch R.H. - Embryo implantation rates in oocyte donation : a prospective comparison of tubal versus uterine transfers. Fertil. Steril., 57 : 362-365, 1992. Berkowitz G.S., Skovron M.L., Lapinski R.H., Berkowitz R.L. - Delayed childbearing and the outcome of pregnancy. N. Engl. J. Med., 322 : 659-664, 1990. Borini A., Bafaro G., Violini F., Bianchi L., Casadio V., Flamigni C. - Pregnancies in postmenopausal women over 50 years old in an oocyte donation program. Fertil. Steril., 63 : 258-261, 1995a. Borini A., Violini F., Bianchi L., Bafaro M.G., Trevisi M.R., Flamigni C. - Improvement of pregnancy and implantation rates in cyclic women undergoing oocyte donation after long-term down-regulation. Human. Reprod., 11 : 3018-3021, 1995b. Burton G., Abdalla H.I., Kirkland A., Studd J.W. - The role of oocyte donation in women who are unsuccessful with in vitro fertilization. Hum. Reprod., 7 : 1103-1105, 1993. Bustillo M., Krysa L. W., Coulam C.B. - Uterine receptivity in an oocyte donation programme. Hum. Reprod., 2 : 442-445, 1995. Cameron I.T., Rogers P.A.W., Caro C., Harman J., Healy D.L., Leeton J.F. - Oocyte donation : a review. Br. J. Obstet. Gynaecol., 96 : 893-899, 1989. Cano F., Simón C., Remohi J., Pellicer A. - Effect of aging on the female reproductive system : evidence for a role of uterine senescence in the decline in female fecundity. Fertil. Steril., 64: 584-589, 1995.Cha K.Y., Koo J.J., Ko J.J., Choi D.H., Han S.Y., Yoon T.K. - Pregnancy after in vitro fertilization of human follicular oocytes collected from nonstimulated cycles, their culture in vitro and their transfer in a donor oocyte program. Fertil. Steril., 55 : 109-113, 1991. Check J.H.O., Shaughnessy A., Lurie D., Fisher C., Adelson H.G. - Evaluation of the mechanism for higher pregnancy rates in donor recipients by comparison of fresh with frozen embryo transfer pregnancy rates in a shared oocyte programme. Hum. Reprod,. 11 : 3022 -3027, 1995. Coulam C.B. - Premature ovarian failure - Fertil. Steril., 38 : 645-655, 1982. Csapo A.I., Pulkkinen M.O., Kaihola H.L. - The effect of estradiol replacement therapy on early pregnancy lutectomized patients. Am. J. Obstet. Gynecol., 117 : 987-990, 1974. Devroey P., Camus M., Van Dell Abbeel E., Van Waesberghe L., Wisanto A., Van Steirteghem A.C. - Establishment of 22 pregnancies after oocyte and embryo donation. Br. J. Obstet. Gynaecol., 96 : 900-906, 1989a. Devroey P., Staessen C., Camus M., De Grauwe E., Wisanto A., Van Steirteghem A.C.- Zygote intrafallopian transfer as a successful treatment for unexplained infertility. Fertil. Steril., 52 : 246-249, 1989b. Feichtinger W. , Kemeter P. - Pregnancy after total ovariectomy achieved by ovum donation. Lancet., ii : 722-723, 1985. Formigli L., Roccio C., Belotti G., Stangalini A., Coglitore M. T., Formigli G. - Oocyte donation by gamete intra-Fallopian transfer to amenorrhoeic and cyclic patients given replacement steroids. Hum. Reprod., 4 : 772 -776, 1989. Franco Jr. J.G., Baruffi R.L.R., Mauri A.L., Petersen C.G., Campos M.S., Aguiar F., Oliveira J.B.A. - Doação de oócitos como tratamento da infertilidade em pacientes com insuficiência ovariana precoce. Rev. Bras. Ginecol. Obstet., 15 : 181-185, 1993.Hodgen G.D. - Surrogate embryo transfer combined with estrogen-progesterone therapy in monkeys : implantation, gestation and delivery without ovaries. JAMA., 250 : 2167-2171, 1983. Jaffe R.B. - The menopause and perimenopausal period. In Reproductive Endocrinology. Edited by S.S.C. Yen, R.B. Jaffe. Philadelphia, W.B. Saunders, p. 406, 1986. Lutjen P.J., Trounson A.O., Leeton J.F., Findlay J.K., Wood E.C., Renou P.M. - The establishement and maintenance of pregnancy using in vitro fertilization and embryo donation in a patient with primary ovarian failure. Nature., 307 : 174-175, 1984. Meldrum D.R., Wisot A., Hamilton F, Gutlay-Yeo A.L., Marr B., Huynh D. - Artificial agonadism and hormone replacement for oocyte donation. Fertil. Steril., 52 : 509-511, 1989. Mignot M.H., Schoemaker J., Kleingeld M., Ramanath Rao B., Drexhage H.A - Premature ovarian failure. I : The association with autoimmunity. Europ. J. of Obst. Gynecol. and Reprod. Biol., 30 : 67 -72, 1989. Moomjy M., Cholst I., Davis O.K., Applegarth L.D., Rosenwaks Z. - Donor oocytes in assisted reproduction - An overview. Sem. Reprod. Endocrinol., 13 : 173-186, 1995. Murphy C.R., Rogers P.A.W., Leeton J.F., Hosie M., Beaton L., MacPherson A. - Surface ultrastructure of uterine epithelial cells in women with premature ovarian failure following steroid hormone replacement. Acta. Anat., 130 : 348-350, 1987. Navot D., Drews M.R., Bergh P.A., Guzman I., Karstaedt A., Scott Jr R.T.- Age-related decline in female fertility is not due to diminished capacity of the uterus to sustain embryo implantation. Fertil. Steril., 61 : 97-101, 1994. Oskarsson T., Edgar D.H., Whalley K.M., Mills J.A. - Clinical and biochemical pregrancy in two respective recipients without ovarian function following gamete intrafallopian transfers using oocytes from a single donor. Scot. Med. J., 35 : 114-115, 1990. Paulson R.J., Sauer M.V., Lobo R.A. - Embryo implantation following human in vitro fertilization : importance of endometrial receptivity. Fertil. Steril., 53 : 870-874, 1990. Paulson R.J., Sauer M.V. - Oocyte donation to women of advanced reproductive age. "How old is too old ?". Hum. Reprod., 9 : 571-572, 1994. Rebar R.W., Erickson G.F., Yen S.S.C. - Idiopathic premature ovarian failure : Clinical and endocrine characteristics. Fertil. Steril., 37 : 35-37, 1982. Remohí J., Gutiérrez A., Cano F.M, Ruiz A., Simón C., Pellicer A. - Long oestradiol replacement in an oocyte donation programme. Hum. Reprod., 6 :1387 - 1391, 1995.Rizk B., Manners C.V., Davies M.C., Steer C.V., Bell S.C., Dillon D., Edwards R.G. - Immunohistochemical expression of endometrial proteins and pregnancy outcome in frozen embryo replacement cycles. Hum. Reprod., 7 : 413-417, 1992. Rosenwaks Z., Veeck L.L., Hung-Ching L. - Pregnancy following transfer of in vitro fertilized donated oocytes. Fertil. Steril., 45 : 417-420, 1986. Sauer M.V., Paulson R.J., Lobo R.A. - Reversing the natural decline in human infertility : an extended clinical trial of oocyte donation to women of advanced reproductive age. JAMA., 268 : 1275-1279, 1992. Sauer M.V., Paulson R.J., Lobo R.A. - Pregnancy in women 50 or more years of age : outcomes of 22 consecutively established pregnancies from oocyte donation. Fertil. Steril., 64 : 111-115, 1995. Serhal P., Craft I. - Simplified treatment for ovum donation. Lancet., 1 : 687-688, 1987. Trounson A.O., Leeton J.F., Besanko M., Wood E.C., Conti A. - Pregnancy established in an infertile patient after transfer of a donated embryo fertilized in vitro. Br. Med. J., 286 : 835-838, 1983. Trounson A., Wood C., Kausche A. - In vitro maturation and fertilization and developmental competence of oocyte recovered from untreated polycystic ovarian patients. Fertil. Steril., 62 : 353-362, 1994. Wu J.T., Chang M.C. - Effects of progesterone and estrogen on the fate of blastocysts in ovariectomized pregnant ferrets : preliminary study. Biol. Reprod., 7 : 231-237, 1972. Yaron Y., Amit A., Mani A., Yovel I., Kogosowski A., Peyser R.M., David M.P., Lessing J.B. - Uterine preparation with estrogen for oocyte donation : assessing the effect of treatment duration on pregnancy rates. Fertil. Steril., 63 : 1284-1286, 1995. Yovich J.L., Blackledge D.G., Richardson P.A., Matson P.L., Turner S.R. , Draper, R. - Pregnancies following pronuclear stage tubal transfer. Fertil. Steril., 48 : 851- 857, 1987.

Tem alguma dúvida?

Estamos a sua disposição.

S7FL
EDUCAÇÃO REDLARA PEC ONLINE

Glossário revisado da Terminologia das Técnicas de Reprodução Assistida (TRA), 2009. Comintê Internacional para Monitorização da Tecnologia Reprodutoiva Assistida (ICMART) e Organização Mundial de Saúde (OMS)